quinta-feira, 27 de agosto de 2009

A NOSSA METADE DA MANTA.

Conta-se que algures, havia um povo que quando os seus velhos se tornavam inuteis, eram levados pelos filhos para a montanha, para que ali esperassem pela morte. Deixavam-lhes um pão e uma manta, e ali ficavam à sua sorte até que a morte chegasse. Um dia, ao ser abamdonado pelo filho, um ancião rasgou a manta ao meio e dando metade ao filho, disse-lhe: "Guarda esta metade para ti, para quando chegar a tua vez".

Confesso que não me recordo como terminava a história, mas vem isto a proposito de uma conversa recente com um amigo, onde me contava este dialogo com uma idosa das Brotas: "Sabe Professor, eu criei oito filhos numa casa pequenina, e couberam lá todos. Hoje eu não cabo em nenhuma das casas deles".

Sabemos que os tempos de hoje não nos deixam grande espaço para cuidar dos nossos velhos em familia, mas será que não nos estamos a esqueçer de qualquer coisa? não podemos tirar um pouco do tempo que passamos no café, no futebol, na caça, na pesca, no computador ou até na igreja, para dedicarmos aos nossos velhos, que despejamos em lares, onde até podem ser, e são certamente bem tratados, mas onde lhes falta o carinho e companhia dos filhos e netos, a quem seguramente ainda têm muito para contar e recordar.

Os mais novos parecem julgar que são eternos.
Ou paramos para pensar, ou só nos resta esperar pela nossa metade da manta.

5 comentários:

  1. Infelizmente os valores da família cederam perante uma sociedade viciada em matrialismo, ao qual para fazer face, esquece tudo o resto.
    Mas aqui não há inocentes. Somos todos culpados.

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  2. Concordo. Mas ainda estamos a tempo de mudar os nossos comportamentos.

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  3. A família é uma instituição ancestral e universal, com a sua diversidade tributária da pluralidade de culturas e sociedades existentes. Com configurações diferentes, apontaremos a família islâmica (poligâmica), a chinesa (organização clânica), a indiana (associada a um sistema de castas) e a japonesa (indissociável da noção de casa). Todas elas têm um elemento comum, o ancião muito valorizado nestas sociedades. Em Portugal a família centrada no casal é a mais predominante. Só que os tempos modernos estão na origem da transformação da família, e ela para sobreviver é extremamente dependente do trabalho-emprego. Num passado muito recente, predominava uma forma de economia agrária em que a família formava uma espécie de unidade de produção, hoje somos cada vez mais dependentes do mercado de emprego, necessitamos de nos deslocar para locais mais distantes para assegurarmos a nossa sobrevivência e acedermos a cada vez mais a bens materiais (casa, carro, etc.). É esta sociedade de consumo que nos transforma, ocupa e faz negligenciar a família e os nossos velhos. Vivemos numa permanente ansiedade do status.

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  4. Amigo JR, as suas intervenções, são um valor acrescentado para este espaço.
    Obrigado por isso.

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  5. Se me permites, caro Aníbal, ainda volto ao tema da manta. Vivemos em tempos de mudança acelerada, não só no conhecimento humano, mas também na nossa sociedade. A passagem de uma sociedade fechada para uma sociedade aberta e veloz, direi feroz, marca a mudança para as novas tendências, mais individualistas e descaracterizando o ser humano como ser gregário. É nesta sociedade competitiva e selectiva que o Estado deve entrar e zelar pelos mais fracos. Neste patamar estão sem dúvida os idosos, que em fim de vida, debilitados fisicamente, psicologicamente e a grande maioria, economicamente, necessitam do nosso carinho e da estabilidade que o seu lar proporciona. As actuais políticas sociais apontam para isso, manter o idoso no seu lar até ser possível. Mas, nestas coisas há sempre um mas, um filho ou uma filha que queira tratar dos seus pais e seja do regime geral a lei não lhe dá possibilidades para o fazer, apenas os trabalhadores do Estado podem faltar 15 dias. É assim, se por um lado, a ansiedade do status nos transforma, por outro, a ansiedade economicista nos impossibilita. Que sociedade mais díspar!

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