terça-feira, 30 de outubro de 2012

LEMBRAR A REFORMA AGRÁRIA


A Reforma Agrária é ainda hoje uma referência do Abril do Povo, mas são cada vez menos os que a viveram. Nesta altura de crise, em que o País e o Povo estão nas mãos de interesses estrangeiros, e em que a cada dia que passa o nosso futuro é mais negro, não posso deixar de lembrar um tempo em que acreditamos que tínhamos o nosso destino nas nossas mãos. Não se cumpriu o sonho, mas a experiência que vivi, essa recordá-la-ei para sempre:



Em Outubro de 1975, quando regressei de Angola, era o tempo do sonho chamado “Reforma Agrária”. Curiosamente não assisti ao chamado Verão quente de 75, de que fez parte a ocupação dos latifúndios agrícolas do Alentejo, mas as noticias chegavam a Angola, e sabia que os camponeses, na tentativa de trazer melhores dias para os campos de Portugal, e mais concretamente para os campos do Alentejo, tinham avançado para a ocupação de milhares de hectares de terra  abandonada, na tentativa de acabar com uma sociedade latifundiária, que condenara à miséria, milhares de Alentejanos.
Pois foi nesse sonho que eu acabei por me integrar. Eu não sabia nada de agricultura, mas foi muito fácil a aprendizagem, pois havia sempre alguém disposto a ensinar. Encontrei um ambiente fantástico onde havia lideres, mas não havia chefes. Todas as decisões eram tomadas em plenário, fosse para comprar ou para vender, ou simplesmente para escolher um responsável para qualquer atividade.

Era visível no rosto das pessoas a felicidade e a confiança com que se enfrentava o trabalho. As pessoas sentiam que eram donas do seu destino e do seu futuro. Aquela gente de mãos calejadas pela enxada, pela roçadora e pela gadanha, não se limitavam a cultivar os vales férteis e fáceis. Eles avançavam sobre os montes e as serras, e arrotearam terras de estevas e tojal bravio que nunca antes tinha visto uma ferramenta. Construíram barragens e mudaram a paisagem. Onde antes havia mato cerrado, apareceram cearas de trigo, milho, centeio, cevada e até tomate. Onde havia salgueirais, voltaram a prosperar os canteiros de arroz.
O Alentejo voltava a ser o “Celeiro de Portugal”.
Na UCP (Unidade Colectiva de Produção) 12 de Maio, fiz de tudo um pouco: Limpei valas e desbravei os silvados que impediam a água de chegar aos cultivos  cavei terra para arroz e semeei pasto para o gado, plantei morangos e até cantei ao desafio. Tornei-me mestre na arte de podar pessegueiros, aprendendo as técnicas de abrir a árvore para entrar o sol, cortar as guias que a faziam crescer demais, dar-lhe largura para facilitar a apanha e escolher as melhores guias que dariam depois a produção do ano seguinte. Desisti de aprender a podar macieiras e ameixeiras, porque nunca me entendi com a técnica.
Foi também ali que aprendi a conhecer o povo a que pertencia, mas a vida levara-me por outras andanças.
O homem do campo daquela altura era rude, pouco instruído e pouco dado às regras do comportamento urbano. Mas era extremamente honesto e confiável. Era trabalhador e tinha um enorme sentido do dever no que respeitava à família. Descobri também que isso do homem do campo bater na mulher, não passava de um mito. Trabalhei com centenas de casais, e na grande maioria dos casos, era ela que dirigia a família, administrava a casa e decidia o que fazia falta e o que era supérfluo. Vi muitas vezes em dia de pagamento, o homem receber o seu ordenado e entregar o envelope à esposa. À hora do almoço, sentados no chão ou em pequenos troncos, eram quase sempre as mulheres que escolhiam o tema da conversa, e eram elas também que escolhiam o rumo que ele tomava.
Mas o sonho não durou muito.
A Reforma Agrária nunca passou de um sonho, e não se traduziu em legislação que alterasse o regime de propriedade, nem da distribuição da terra.
Os latifundiários apoiados pelos diversos governos, de que eles e os seus interesses também faziam parte, acabaram por recuperar as terras que não se sabem bem como foram adquiridas ao longo dos tempos, e a resposta à pobreza do campesinato Alentejano, fica mais uma vez adiado, por culpa da improdutividade de largos milhares de hectares de terra abandonada pela burguesia estéril e inútil deste pobre país.
O resultado não se fez esperar: Nos anos 80 o governo indemniza os latifundiários com chorudas recompensas que acompanham a devolução da terra melhorada, e a pobreza voltou ao Alentejo, e com ela a necessidade do povo voltar à emigração.
Resta-nos a esperança chamada “Alqueva”- um dos sorvedouros dos dinheiros públicos de que ninguém fala, e que visa transformar o Alentejo num imenso campo de golfe para os senhores do grande capital recuperarem forças das árduas tarefas diárias.
Para nós, povo Alentejano, sobram os quilómetros e quilómetros de arame farpado, e milhares de tabuletas ameaçadoras que nos atiram à cara os decretos-lei que nos proíbem sequer a aproximação, quanto mais apanhar uns espargos, tubaras ou “outros frutos silvestres”.
Das 412 Cooperativas e UCPs criadas com a Reforma Agrária, resta a memória das pessoas que deram corpo a um movimento que abriu brechas na sociedade Portuguesa, mas que acabou por não cumprir o sonho, tal como o próprio 25 de Abril não cumpriu.

Mas o Povo está na Rua. Teremos nós força para acordar do pesadelo, e recuperar o sonho?


Aníbal Lopes

(Na imagem - Mural UDP, 1980, in Citizen Grave)


sexta-feira, 19 de outubro de 2012

MARTE FICA ALI, AO VIRAR DA ESQUINA



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sábado, 13 de outubro de 2012

60 ANOS


A vida tem a duração de um instante.
Talvez por isso não tive tempo de soltar amarras.
Por falta de tempo. Ou por medo do vento.
Continuo sem encontrar saída para as minhas dúvidas
Por falta de tempo. Ou por medo das respostas.
Ainda tenho coisas para recomeçar.
Por falta de tempo. Ou por medo de falhar de novo.
Ainda tenho fechado parte do meu espirito.
Por falta de tempo. Ou por preconceito.
Ainda tenho sonhos por concretizar.
Por falta de tempo. Ou por falta de fé.

Falta-me tempo para envelhecer. É ainda demasiado cedo.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE


 

O grande problema ecológico dos nossos dias, é o facto de o ritmo de exploração, degradação e destruição dos recursos naturais, ser superior à capacidade da própria natureza repor esses recursos. Se o homem continuar neste ritmo de destruição maciça de tudo o que o rodeia, o que sobrará para as gerações futuras, são rios poluídos, florestas assassinadas e um ar irrespi
rável, que porá em causa a sua sobrevivência.
Mas a que se deve a destruição da terra em que vivemos? O que leva o homem a ser o seu próprio coveiro?
A ambição. O homem tem explorado tudo na natureza: Os minerais, as florestas e os animais. Mas raramente se preocupa em reparar os seus malefícios. A finalidade é sempre a mesma: A busca desenfreada do lucro.
O sistema capitalista está ligado à produção em massa. Para obter matéria-prima é preciso retirar da natureza diversos recursos. Para manter os lucros, há que continuar uma exploração desenfreada, mesmo que o saldo seja uma devastação profunda do meio-ambiente.
Ultimamente a humanidade tem comprovado os reflexos dessa devastação tais como aquecimento global, elevação dos oceanos, mudanças climáticas, escassez de água entre muitos outros.
Actualmente fala-se muito em energias renováveis, como a água, o sol, o vento ou a biomassa. São as chamadas energias limpas, pois não libertam gases ou resíduos que contribuem para o aquecimento global. Mas parece-me pouco provável que estas energias possam substituir na totalidade o consumo de combustíveis fósseis. Julgo que é preciso, a nível mundial, uma nova política energética, que reduza o consumo desenfreado de energia, principalmente em certos países que só por si, impedem outros de ter a energia de que precisam.
E nós?? O cidadão comum, o que pode fazer? Será que nos é licito continuarmos impávidos e serenos enquanto o nosso mundo, que é também o mudo dos nossos filhos e netos, se vá extinguindo? Acalmará a nossa consciência, o facto de usarmos lâmpadas económicas, separarmos o lixo, ou pouparmos água? Não me parece.
O problema é mais profundo e exige de nós uma intervenção efectiva e activa. Ou fazemos ouvir a nossa voz indignada ou seremos calados para sempre

Aníbal Lopes