domingo, 15 de novembro de 2009

RECORDAÇÕES - Feira de Montargil

A feira do meu tempo de menino, faz parte das minhas lembranças mais longínquas. Tão longínquas que se confundem com o meu imaginário.
Idos dos montes, alguns bem longe, lá ia-mos nós a caminho da vila. Ás costas, o saco onde se levava os sapatos, as meias e o farrapo que serviria para limpar os pés descalços, à entrada da vila. Pelo caminho encontrávamos outras famílias. Exibíamos as nossas camisas de TV, enquanto as nossas mães faziam gala das suas saias de tirylene, com minúsculas pregas toda a volta. Por vezes passavam por nós algumas carroças, naturalmente dos mais abastados.

Pouco depois do Senhor das Almas, era a altura de calçar os sapatos, que acabariam por nos morder os calcanhares. No laranjal, era a feira do gado. Para que era do campo, o gado pouco nos dizia. Para nós, a feira era outra.

Ao chegar à primeira escola, ainda antes do largo, já havia feira; alumínios e diversas louças de barro. Mais uns metros, e heis que nos surge o mundo que esperávamos. Quinquilharias, muitos brinquedos e luzes. Muitas luzes, muito som. Dos carrinhos de choque, do carrocel e do circo. Sim !!! do circo. Esse mundo fantástico de onde vinha o som mais apelativo: " é entrar senhores, é entrar. Circo Cardinali, o maior espectáculo do mundo. Burros que falam, mulheres com barbas, homens capazes de engolir facas, e de comer montanhas de vidros, enquanto cospem fogo pelo nariz. Cães amestrados e serpentes capazes de engolir um homem. Duas parelhas de palhaços, duas."

Claro que nós íamos ao Circo. Mas enquanto não chegava a hora, andávamos atrás dos mais velhos. Era ve-los de marreta em punho a bater numa base de ferro, para ver quem elevava mais alto, um certo ponteiro. Cada marretada, 5 tostões. Havia também um carrinho de ferro, que impulsionado pela força do braço, deslizava por um carril, e rebentava uma bomba, lá em cima. Se não rebentava, significava falta de força, e era humilhação certa.

Depois vinham as barraquinhas dos "tirinhos", onde quais pistoleiros do far-west, se descarregavam tiros sobre umas fitinhas que nunca mais partiam, nem os maços de tabaco caiam. Quando os moços fartos de gastar dinheiro, se preparavam para desistir, logo a menina da barraca se encostava ao balcão, e exibia generosamente um decote que prometia tudo e não dava nada. Como a esperança é a ultima coisa que se perde, lá iam mais uns tirinhos.

A feira era também um local onde se encontravam as pessoas que andavam "lá pra baixo", e que só nesta altura vinham à terra.
Claro que ás vezes também havia umas rixas tocadas a vinho tinto e bagaço, algumas delas acabadas na minúscula prisão que havia por de traz da igreja, onde o cabo Matos os punha, para arejar as ideias.

Recordo-me também, que muitas mães e namoradas dos rapazes que andavam "lá fora", não iam à feira.

De volta a casa, já de madrugada, cansados mas felizes e empunhado o brinquedo que nos calhara, ia-mos sonhar com a próxima feira
Da feira da minha infância, sobram as actuais feiras de plástico, quais montras de vaidade, onde nos querem mostrar o que não há, e por vezes esconder o que está à vista de todos.

Mas isso deve ser o azedume provocado pela minha face nostálgica, a falar.
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2 comentários:

  1. Caro Senhor, que me lembre nunca estive na feira de Montargil, mas nesse tempo a feira de Pavia, era exactamente como descreve a da sua terra. Infelizmente hoje a feira da minha terra não é nem de papel pardo, quanto mais de plastico.
    Outros tempos...

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  2. E a minha é um espetaculo!!É uma Expo!!

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