sábado, 19 de novembro de 2016

COISAS DO PIRILAU

O meu amigo e conterrâneo Prates Miguel, Escritor, Poeta e ilustre Advogado, tem o condão de chegar a documentos (ou eles chegam até ele) verdadeiramente surpreendentes. Não só pelos termos e pelo tempo, como também pela aplicação ao nosso tempo que nos vem logo à ideia.
Com a devida vénia aqui transcrevo esse documento, bem como o seu parecer final, visto à luz deste tempo.
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COISAS DO PIRILAU -  Prates Miguel
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À minha caixa de correio electrónico chegou e-meil que transcreve sentença proferida em 15/10/1883 pelo Juiz de Direito de Vila de Porto da Folha, província de Sergipe e recolhida no Arquivo Histórico de Alagoas – Brasil, do seguinte teor:
“(…) quando a mulher do Xico Bento ia para a fonte, já perto della, o cabra Manoel Duda sahiu de supetão de em uma moita de mato e fez proposta à dita mulher, por quem queria para coisa que se não pode trazer a lume, e como ella se recuzasse, o dito cabra abrafolou-se della, deitou-a ao chão, deixando as encomendas della de fora e ao Deus dará.
Elle não conseguiu matrimónio porque ella gritou e veio em amparo della Nocreto Corrêa e Norberto Barbosa, que prenderam o cujo em flagrante.
Considero (…) e condeno o cabra Manoel Duda (…) a ser capado, capadura que deverá ser feita a macete. A execução desta peça deverá ser feita na cadeia desta villa. Nomeio carrasco o carcereiro. Cumpra-se e apregue-se editais nos lugares públicos”.
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Mais o remetente se questiona acerca do tratamento deste caso num tribunal português actual. Ora, salvo o devido respeito por diferente entendimento – que a doutrina e a jurisprudência nunca são unânimes – a decisão seria assim:
Porque o mestiço Manoel Duda teria cometido um crime de coacção sexual na forma tentada (arts. 163 e 23 nº 2 do Código Penal ) haveria de ser condenado por juiz benévolo, no mínimo, à pena de um ano de prisão, eventualmente suspensa. Por seu turno, o juiz e o carcereiro do séc XIX por ofensa grave à integridade física do corpo de outra pessoa, privando-a de importante órgão ou membro e tirando-lhe a capacidade de procriação, estariam incursos em co-autoria moral e material, respectivamente, num delito previsto e punido pelo art. 144 do mesmo diploma legal e, pelo baixo, passariam dois anos a ver o sol aos quadradinhos.

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