sábado, 31 de outubro de 2009

O FORNO DE TIJOLO DO TELHEIRO

São maravilhosas lembranças, as que tenho da cerâmica do Telheiro, a que todos chamavam de forno.

Foi lá que observei o amassar do barro e a arte de lhe dar forma. Perdi horas a ver como eram feitos os buracos no tijolo, nos seus diversos tamanhos, e as estranhas formas das telhas, fosse lusa ou marselha.

Assisti ao enfornar e desenfornar, com o inferno da cosedura pelo meio.

Eu sabia tudo sobre o forno do Telheiro. Porquê…!?

Sempre que estávamos de férias escolares, lá ia eu e o Hermínio, que já era Cagadaia, a caminho do forno do Telheiro levar o almoço ao Ti Zé do Moinho e ao Tonho Damásio, pai e irmão do Hermínio, que eram trabalhadores do forno.

À hora do almoço, ficávamos junto dos operários a ouvir as suas histórias de vida, que nos pareciam fantásticas, próprias de pessoas que sabem muita coisa.

Era sempre muito agradável, pois o Sr. Adriano, que era o dono da cerâmica, autorizava que nós andasse-mos livremente por todo o lado, observando os operários nos seus diversos labores, e acompanhando a feitura dos materiais em todas as suas fases.

Mas melhor que tudo, era o facto do Sr. Adriano nos permitir mexer no barro e fazer bonecos e testos para as panelas, que punha-mos a secar junto com as telhas, e que depois as nossas mães aproveitavam.

Aproveitavam sim, porque os operários da cerâmica, mesmo quando não estávamos presentes, eles próprios carinhosamente, colocavam no forno por cima das telhas, os nossos artísticos artefactos, que igualmente retiravam ao desenfornar, e guardavam em lugar seguro, até que nós aparecesse-mos de novo.

Por vezes as coisas corriam mal e, naturalmente por defeito de fabrico, lá vinha um boneco sem pernas ou um testo sem carrapicho, que era como chamávamos ás pegas dos ditos. Nada de grave, já que podíamos sempre fazer mais.

Faltava-nos assistir a uma noite de cozedura. A cozedura era feita de noite, para aproveitar o “fresco”, já que era feita a altas temperaturas.

Finalmente fomos autorizados a assistir. Ficamos a uma distância segura, mas deu para ver bem.

A parte onde era alimentado o fogo das cozeduras, ficava a um nível bastante inferior à área de fabrico, e entre o fogo e o nível superior, ficavam criteriosamente dispostos, os tijolos e telhas a cozer.

Facilmente se compreendia que o acto da cozedura, devia ser terrível para os operários.

Colocados em fila entre a boca do forno e a montanha de mato, cada um com o seu forcado iam passando o mato uns aos outros, até ao fogo. O que estava mais próximo, era o que mais sofria. A táctica que usavam, faz-me lembrar hoje o que fazem os ciclistas, quando em contra relógio por equipas: O da frente puxa ao máximo, e sai da formatura para o ultimo lugar, dando lugar ao que estava atrás de si, num movimento sucessivo.

Mesmo à distância, nós sentíamos o calor intenso, e podíamos imaginar o que aqueles homens, sempre em movimento frenético, estavam a suportar.

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