sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

O MEU CHÃO

“ o passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente”
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As melhores amizades são reconhecidamente as da infância e adolescência. Há até quem diga que mesmo depois de muitos anos de desencontros, quando se reencontra um amigo de infância, se recomeça uma conversa como se fora interrompida no dia anterior.
É dessas amizades que sinto saudades. Acho até que sinto alguma orfandade desses amigos de quem desde demasiado cedo, por força das circunstâncias, me fui afastando. Muito cedo deixei aquilo que agora se chama de “zona de conforto” para me fazer à vida, como era obrigação na ordem então estabelecida. Quis o destino ou má sorte, que nunca me fixasse por muito tempo no mesmo lugar. Saltitar entre sítios e lugares, muitas vezes mais para me afastar, do que na procura de algo, deixou-me pouco tempo para fomentar novas amizades, mas tempo suficiente para me ir afastando das antigas e recebendo em troca, mais angustia e desassossego.
Foi correndo “seca e meca” que me fiz adulto, e se me abriram novos caminhos e novas opções, e a agitação da vida, a construção de uma família e a criação e educação dos filhos, absorveu-me de tal maneira, que acabei por esquecer o tempo dos primeiros amigos, companheiros de aventuras e da partilha de algumas descobertas, e de quem perdi completamente o rasto.
Mas há um tempo que inevitavelmente acontece; Os passarinhos filhos abrem as asas e abandonam o ninho, que fica demasiado vazio para os velhos pássaros pais, e então começa a sobrar-lhes tempo. É o tempo de sentir saudade, e de lembrar as origens e voltar ao passado. Descubro que grande parte do meu presente, são lembranças desse passado, e concluo que a saudade é de alguma forma, a presença da ausência do que recordamos. Parece complicado, mas quem viaja pelo seu interior, compreende bem.
É nessa presença que vou encontrar de novo os meus amigos da infância e adolescência. Lembro-os tal qual como os deixei, mas não sei onde estão nem como são agora. Pergunto-me se eles também terão saudades minhas, e reparo que isso parece ser importante para mim.

O tempo e a vida curtiram demasiado a minha pele e a minha alma. Á minha volta construí uma carapaça defensiva e protectora, que agora parece apresentar várias fendas.
Sinto falta do meu chão. O chão onde nasci e percorri a pés descalços, juntamente com aqueles que agora recordo, e não sei por onde andam.

Aníbal Lopes
Fev/14

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