quinta-feira, 5 de abril de 2012

UMA AVENTURA AFRICANA

O Salsicha tinha acabado de chegar a Luanda. Estando eu de Cabo de Dia, coube-me receber o Salsicha e proceder às conformidades.
Ora era sabido que todos os maçaricos recém chegados, vinham aviados de muita “massa”. O Cabo Grilo, que raramente perdia a oportunidade de se alambazar com a ingenuidade de quem chegava, veio logo ter comigo:
-- Ó Lopes, então não levamos o maçarico aos gambuzinos?
-- Estás a pensar em quê?
-- Talvez uma jantarada no Kátekero.
-- Tá bem, pronto. Organiza lá isso.
O Grilo não perdeu tempo. Muito solicitamente ofereceu-se ao Salsicha para lhe mostrar os melhores recantos da cidade. Para o Grilo, conquistar a confiança de alguém, era tão fácil como fumar um cigarro. Era de facto um tipo simpático e cheio de boas maneiras.
Bom, a verdade é que 2 ou 3 dias depois, lá fomos os três de visita à cidade, começando naturalmente pelo jantar. O sítio escolhido foi o Kátekero, e a ementa, da responsabilidade do Grilo. Depois de bem comidos e bem bebidos, o Grilo começou a sentir-se mal disposto, e foi à casa de banho. Entretanto eu e o Salsicha acabávamos outra garrafa.
A demora do Grilo começou a preocupar-nos, e eu decidi ir ver dele, pois podia estar mal.
Quando cheguei à rua, o Grilo estava à minha espera. Claro que desaparecemos, deixando o “pato” à conta do Salsicha.
Na verdade, nós nunca mais nos lembramos do Salsicha, a não ser cerca das 2 da manhã, quando ele nos acordou num choro enorme, fazendo-nos toda a espécie de acusações e dizendo que a PM estava à porta á espera do dinheiro. Afinal o desgraçado estava teso, e ao aperceber-se da situação, o gerente do Hotel chamou a Policia Militar. A solução era mesmo sermos nós a pagar a conta, e pedir a Deus que o gerente se contentasse com o pagamento sem fazer seguir a participação.
Enquanto juntava o dinheiro, o Grilo rogava pragas ao maçarico trouxa e imbecil, e maldizia o marisco que comera, pensando que era de borla.
Com o dinheiro na mão e ainda soluçando. o pobre do Salsicha lá foi levar o dinheiro, na companhia da PM.
Felizmente a coisa ficou por aqui, e os receios da participação não se confirmaram, e a história acabou esquecida.
Meses depois, o nosso amigo Grilo terminou a sua comissão de serviço, e estava de regresso à Metrópole. Para nos despedirmos do nosso amigo, voltamos os três ao Kátekero, desta vez sem marosca, tanto mais que o Salsicha conquistara o seu espaço, e era já um igual entre os seus pares.
Desta vez não foi o Grilo a escolher a ementa, mas sim cada um pediu o que quis. Quando chegou a hora do pagamento, e muito surpreendentemente, o Salsicha ordenou:
-- Guardem lá o dinheiro, que hoje quem paga sou eu.
-- Tu?? Mas saiu-te o totobola??
-- Nada disso. O dinheiro é vosso. Da outra vez, eu também fugi sem pagar.
Ficamos de boca aberta a olhar um para o outro. Para quem se julgavam veteranos de guerra, aquilo ultrapassava as raias da lição e aproximava-se da humilhação. Acabávamos de descobrir que tínhamos sido “comidos” por um maçarico de camuflado novinho em folha e ainda a cheirar a leite. O Grilo custou a aguentar, e até ameaçou vomitar o maldito jantar.
Mas acabou tudo num abraço, e calhou ao Grilo pagar a espora de saída.

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