sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

FELIZ ANO NOVO


A todos os amigos deste blog, desejo um novo ano pleno de realizações pessoais e familiares.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

UMA ATRACÇÃO CHAMADA ZULMIRA





A Zulmira é hoje conhecida, não só em Mora, mas também muito para alem da nossa terra.
Quase diariamente a podemos encontrar na Sede do Luso, onde é atracção das objectivas dos telemóveis dos viajantes dos Expressos que ali fazem paragem.
Claro que a Zulmira está muito mais interessada nos carapaus que a Joana, a Ana e a Corina lhe dão, do que em ser modelo fotográfico.
A Zulmira é um animal completamente livre, mas que todos os dias opta por regressar a casa do seu tratador, certamente por ser tratada com todo o carinho.

(Fotos de José Artur Macedo, com a devida vénia)

domingo, 26 de dezembro de 2010

AGORA QUE O NATAL SE FOI...

...é preciso fazer com que a união e a solidariedade possa romper as dificuldades que se avizinham.

Quando um Homem Quiser

Tu que dormes a noite na calçada de relento
Numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
Tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
És meu irmão amigo
És meu irmão

E tu que dormes só no pesadelo do ciúme
Numa cama de raiva com lençóis feitros de lume
E sofres o Natal da solidão sem um queixume
És meu irmão amigo
És meu irmão

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher

Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
Tu que inventas bonecas e combóios de luar
E mentes ao teu filho por não os poderes comprar
És meu irmão amigo
És meu irmão

E tu que vês na montra a tua fome que eu não sei
Fatias de tristeza em cada alegre bolo-rei
Pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei
És meu irmão amigo
És meu irmão

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser

Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher

(José Carlos Ary dos Santos)

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

FELIZ NATAL

POR ESTE RAIA ACIMA, deseja a todos os amigos que fazem o favor de nos visitar, um Natal cheio de paz e felicidade.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Wikiliquidação do Império?

 ( texto de Boaventura Sousa Santos)



A divulgação de centenas de milhares de documentos confidenciais, diplomáticos e militares, pela Wikileaks, acrescenta uma nova dimensão ao aprofundamento contraditório da globalização. A revelação, num curto período, não só de documentação que se sabia existir mas à qual durante muito tempo foi negado o acesso público por parte de quem a detinha, como também de documentação que ninguém sonhava existir, dramatiza os efeitos da revolução das tecnologias de informação e obriga a repensar a natureza dos poderes globais que nos (des)governam e as resistências que os podem desafiar. O questionamento deve ser tão profundo que incluirá a própria Wikileaks: é que nem tudo é transparente na orgia de transparência que a Wikileaks nos oferece.

A revelação é tão impressionante pela tecnologia como pelo conteúdo. A título de exemplo, ouvimos horrorizados este diálogo: Good shooting. Thank you, enquanto caem por terra jornalistas da Reuters e crianças a caminho do colégio, ou seja, enquanto se cometem crimes contra a humanidade. Ficamos a saber que o Irão é consensualmente uma ameaça nuclear para os seus vizinhos e que, portanto, está apenas por decidir quem vai atacar primeiro, se os EUA ou Israel. Que a grande multinacional farmacêutica Pfizer, com a conivência da embaixada dos EUA na Nigéria, procurou fazer chantagem com o procurador-geral deste país para evitar pagar indemnizações pelo uso experimental indevido de drogas que mataram crianças. Que os EUA fizeram pressões ilegítimas sobre países pobres para os obrigar a assinar a declaração não oficial da Conferência da Mudança Climática de dezembro passado em Copenhaga, de modo a poderem continuar a dominar o mundo com base na poluição causada pela economia do petróleo barato. Que Moçambique não é um Estado-narco totalmente corrupto mas pode correr o risco de o vir a ser. Que no "plano de pacificação das favelas" do Rio de Janeiro se está a aplicar a doutrina da contrainsurgência desenhada pelos EUA para o Iraque e Afeganistão, ou seja, que se estão a usar contra um "inimigo interno" as táticas usadas contra um "inimigo externo".

Irá o mundo mudar depois destas revelações? Já sabíamos que os poderes políticos e económicos globais mentem quando fazem apelos aos Direitos Humanos e à democracia, pois que o seu objetivo exclusivo é consolidar o domínio que têm sobre as nossas vidas, não hesitando em usar, para isso, os métodos mais fascistas e violentos. Tudo está a ser comprovado, e muito para além do que os mais avisados poderiam admitir. O maior conhecimento cria novas oportunidades para mobilizações de cidadãos em defesa da democracia e da transparência. Mas também cria novas exigências de análise.

Há que distinguir entre a autenticidade dos documentos e veracidade do que afirmam. Por exemplo, que o Irão seja uma ameaça nuclear só é "verdade" para os maus diplomatas que, ao contrário dos bons, informam os seus governos sobre o que estes gostam de ouvir e não sobre a realidade dos factos. Do mesmo modo, que a tática norte-americana da contrainsurgência esteja a ser usada nas favelas é opinião do Consulado Geral dos EUA no Rio. Compete aos cidadãos interpelar o governo nacional, estadual e municipal sobre a veracidade desta opinião. Tal como compete aos tribunais moçambicanos averiguar a alegada corrupção no país. O importante é sabermos que muitas das decisões de que podem resultar a morte de milhares de pessoas e o sofrimento de milhões são tomadas com base em mentiras.

Por outro lado, será cada vez mais crucial fazermos o que chamo uma sociologia das ausências: o que não é divulgado quando aparentemente tudo é divulgado. Resulta muito estranho que Israel, um dos países que mais poderia temer as revelações devido às atrocidades que tem cometido contra o povo palestiniano, esteja tão ausente dos documentos confidenciais. Há a suspeita fundada de que foram eliminados por acordo entre Israel e Julian Assange. Isto significa que vamos precisar de uma wikileaks alternativa ainda mais transparente. Talvez já esteja em curso a sua criação.

domingo, 19 de dezembro de 2010

MORREU CORREIA DOS SANTOS


O último grande herói de uma geração fantástica do hóquei em Patins Português, morreu hoje, aos 84 anos.
Sempre jogou no seu Paço de Arcos, pelo qual marcou mais de 3.000 golos. Foi 158 vezes internacional, e marcou 307 golos pela Selecção.
Foi 8 vezes Campeão Nacional, 6 vezes Campeão do Mundo, e outras tantas campeão da Europa.
Como amante do Hóquei, tenho a certeza que assim que chegar "lá acima" o Selecionador de lá, vai imediatamente convoca-lo, e em breve vai ser titular da equipa do céu.

Até sempre campeão.

(Foto e pesquisa," A BOLA")

A maior desgraça de uma nação pobre é que em vez de produzir riqueza, produz ricos. Mas ricos sem riqueza (texto de Mia Couto)




A maior desgraça de uma nação pobre é que em vez de produzir riqueza, produz ricos. Mas ricos sem riqueza.

Na realidade, melhor seria chamá-los não de ricos mas de endinheirados. 
Rico é quem possui meios de produção. Rico é quem gera dinheiro» dá emprego. 
Endinheirado é quem simplesmente tem dinheiro. Ou que pensa que tem. Porque, na realidade, o dinheiro é que o tem a ele. A verdade é esta: são demasiado pobres os nossos “ricos”. Aquilo que têm, não detêm. Pior, aquilo que exibem como seu é propriedade de outros. É produto de roubo e de negociatas. Não podem, porém, estes nossos endinheirados usufruir em tranquilidade de tudo quanto roubaram. Vivem na obsessão de poderem ser roubados.
Necessitariam de forças policiais à altura. Mas forças policiais à altura acabariam por os lançar a eles próprios na cadeia. Necessitariam de uma ordem social em que houvesse poucas razões para a criminalidade. Mas se eles enriqueceram foi graças a essa mesma desordem.

O maior sonho dos nossos novos-ricos é, afinal, muito pequenito: um carro de luxo, umas efémeras cintilâncias. Mas a luxuosa viatura não pode sonhar muito, sacudida pelos buracos das avenidas. O Mercedes e o BMW não podem fazer inteiro uso dos seus brilhos, ocupados que estão em se esquivar entre chapas muito convexos e estradas muito côncavas. A existência de estradas boas dependeria de outro tipo de riqueza Uma riqueza que servisse a cidade. E a riqueza dos nossos novos-ricos nasceu de um movimento contrário: do empobrecimento da cidade e da sociedade.

As casas de luxo dos nossos falsos ricos são menos para serem habitadas do que para serem vistas. Fizeram-se para os olhos de quem passa. Mas ao exibirem-se, assim, cheias de folhos e chibantices, acabam atraindo alheias cobiças. O fausto das residências chama grades, vedações electrificadas e guardas privados. Mas por mais guardas que tenham à porta, os nossos pobres-ricos não afastam o receio das invejas e dos feitiços que essas invejas convocam.

Coitados dos novos ricos. São como a cerveja tirada à pressão. São feitos num instante mas a maior parte é só espuma. O que resta de verdadeiro é mais o copo que o conteúdo. Podiam criar gado ou vegetais. Mas não. Em vez disso, os nossos endinheirados feitos sob pressão criam amantes. Mas as amantes (e/ou os amantes) têm um grave inconveniente: necessitam ser sustentados com dispendiosos mimos. O maior inconveniente é ainda a ausência de garantia do produto. A amante de um pode ser, amanhã, amante de outro. O coração do criador de amantes não tem sossego: quem traiu sabe que pode ser traído.

Os nossos endinheirados-às-pressas não se sentem bem na sua própria pele. Sonham em ser americanos, sul-africanos. Aspiram ser outros, distantes da sua origem, da sua condição. E lá estão eles imitando os outros, assimilando os tiques dos verdadeiros ricos de lugares verdadeiramente ricos. Mas os nossos candidatos a homens de negócios não são capazes de resolver o mais simples dos dilemas: podem comprar aparências, mas não podem comprar o respeito e o afecto dos outros. Esses outros que os vêem passear-se nos mal-explicados luxos. Esses outros que reconhecem neles uma tradução de uma mentira. A nossa elite endinheirada não é uma elite: é uma falsificação, uma imitação apressada.

A luta de libertação nacional guiou-se por um princípio moral: não se pretendia substituir uma elite exploradora por outra, mesmo sendo de uma outra raça. Não se queria uma simples mudança de turno nos opressores. Estamos hoje no limiar de uma decisão: quem faremos jogar no combate pelo desenvolvimento? Serão estes que nos vão representar nesse relvado chamado “a luta pelo progresso”? Os nossos novos ricos (que nem sabem explicar a proveniência dos seus dinheiros) já se tomam a si mesmos como suplentes, ansiosos pelo seu turno na pilhagem do país.

São nacionais mas só na aparência. Porque estão prontos a serem moleques de outros, estrangeiros. Desde que lhes agitem com suficientes atractivos irão vendendo o pouco que nos resta. Alguns dos nossos endinheirados não se afastam muito dos miúdos que pedem para guardar carros. Os novos candidatos a poderosos pedem para ficar a guardar o país. A comunidade doadora pode irás compras ou almoçar à vontade que eles ficam a tomar conta da nação. Os nossos ricos dão uma imagem infantil de quem somos. Parecem criancas que entraram numa loja de rebuçados. Derretem-se perante o fascínio de uns bens de ostentação.

Servem-se do erário público como se fosse a sua panela pessoal. Envergonha-nos a sua arrogância, a sua falta de cultura, o seu desprezo pelo povo, a sua atitude elitista para com a pobreza. Como eu sonhava que Moçambique tivesse ricos de riqueza verdadeira e de proveniência limpa! Ricos que gostassem do seu povo e defendessem o seu país. Ricos que criassem riqueza. Que criassem emprego e desenvolvessem a economia. Que respeitassem as regras do jogo. Numa palavra, ricos que nos enriquecessem. Os índios norte-americanos que sobreviveram ao massacre da colonização operaram uma espécie de suicídio póstumo: entregaram-se à bebida até dissolverem a dignidade dos seus antepassados. No nosso caso, o dinheiro pode ser essa fatal bebida. Uma parte da nossa elite está pronta para realizar esse suicídio histórico. Que se matem sozinhos. Não nos arrastem a nós e ao país inteiro nesse afundamento.

MIA COUTO

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

MORREU O PAI DA PANTERA



A Pantera Cor de rosa, que viu crescer várias gerações, ficou ontem orfã.
Blake Eduards, o pai da Pantera, morreu ontem aos 88 anos, mas a sua obra será eterna.
A Pantera Cor de Rosa nunca morrerá.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Do "imaginário de anárquico infantilismo" promovido pelo Estado


Seguindo os links fornecidos pelo post da Ana, desemboco neste texto do João Lopes:

Há uma primeira interrogação que importa formular. E é dirigida, não ao WikiLeaks, mas a uma das formas mais correntes de tratamento jornalístico da sua existência. Dito de outro modo: existem, hoje em dia, formas de intervenção jornalística que promovem sistematicamente uma noção pueril, e puerilmente libertária, da informação. Segundo tal noção, informar seria colocar tudo a nu.

(…) Em boa verdade, a não ser no espaço específico da pornografia, ninguém alguma vez postulara uma tal reivindicação de totalidade (…)(e sabemos como muitas formas dominantes de jornalismo menosprezam as singularidades da escrita, apresentando-se como "naturais", quer dizer, tentando rasurar a especificidade de qualquer linguagem). Agora, vivemos num aquário de "transparência" dominado por esse jornalismo da totalidade, tendo a totalidade os contornos e os limites do seu próprio imaginário de anárquico infantilismo televisivo. Tal jornalismo, ao ver no WikiLeaks a promessa de um mundo apaziguado pela sua própria transparência, incorre numa responsabilidade central, com a qual, sintomaticamente, evita lidar. Ou seja: que fazer com o Estado — e a concepção do mundo que nele se exprima e transfigura — a partir do momento em que deixa de haver domínio específico do saber e da informação estatal?


Mas a resposta é simples: propor aos cidadãos comuns organizados que assumam o exercício — eminentemente formativo e civilizador — do poder político democrático, bem como o domínio do saber e da informação hoje formatados pelo modelo estatal que o João Lopes naturaliza e consagra. O que teria por efeito, entre outras coisas importantes, dissipar o "imaginário de anárquico infantilismo televisivo" induzido pela infantilização política hoje promovida, contra a exigente tradição civilizacional da cidadania,  como condição necessária de funcionamento da instituição estatal.

Coro de Câmara de Montargil -



Coro da minha terra, na Igreja onde fui Acólito, há quase 50 anos.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

SÍTIOS E VIVÊNCIAS

É conhecido, pelo menos no meu círculo de amigos, o amor que sinto pelos sítios e vivências da minha infância, e a saudade que me invade sempre que a sua memória ocupa o meu coração.

Muitos desses sítios estão hoje totalmente diferentes, ou mesmo desapareceram, mas na minha memória estão exactamente igual e no mesmo sítio.

Basta-me fechar os olhos para nadar “em pelica”no tanque da minha horta, beber água na fonte do Ti Zé do Moinho, que enchia a presa onde as mulheres lavavam a roupa, ou moldar barro no Forno do Telheiro.

Posso facilmente apanhar camarinhas na Terra Preta, Mirtilos (mortinhos) no Carvalhoso, medronhos no Vale da Areia, ou marmelos na horta do meu tio Manuel Galiza.

Se continuar de olhos fechados, posso ainda entrar na Azenha do meu Tio Artur do Moinho, depois de olhar extasiado a roda gigante movida pela água aprisionada na presa, e que faz mover as mós, que num movimento rotativo e continuo, transforma o trigo ou o milho em farinha, enquanto no ar, uma suave névoa branca vai-se mantendo suspensa, até cair suavemente sobre tudo à volta, como se fora uma fina camada de neve.

E que dizer das enormes pescarias feitas no Vale da Terra Preta? Enquanto a minha mãe e as minhas tias dispõem ou mondam o arroz, eu e o meu tio António, pouco mais velho que eu, atacamos o Vale munidos de um cesto de verga com casca. Um fica a “aparar” e o outro bate a pé descalço as margens do vale, empurrando bordalos, pardelhas e cágados contra o cesto, que no tempo certo é levantado cheio de lismos e espadanas, mas também o prémio para tão exímios pescadores: O tão desejado peixe, que apesar de pequeno, é aproveitado para a janta.

Desses tempos longínquos, lembro também dos serões de verão, passados em casa de vizinhos, ou simplesmente sentado no poial fronteiriço à minha casa, olhando as estrelas e a lua, que segundo rezava a história, representava um homem de forquilha na mão, a empurrar mato para dentro de um forno.

Ou então as noites frias de Dezembro, sentado no meu mocho à lareira, sempre de olho nos pingos que caíam dos enchidos pendurados nas varas, que curavam ao calor e ao fumo das estevas e tanganhos de esgalha de azinho, apanhados naqueles cabeços de onde vinham também as boletas que assava num pequeno espaço aberto entre as brasas, e que eu tanto gostava.

Também esperava ansiosamente pelo Domingo, em que vestindo as minhas melhores calças de cotim azul, ia para a venda do meu Tio Manuel Gabriel, que permitia que eu me sentasse do lado de dentro do balcão da taberna, por baixo do enorme rádio, onde ouvia os relatos dos jogos do Benfica.

Pode parecer-vos estranho ter tão presentes aqueles tempos difíceis, e mais ainda, que os recorde com tanta saudade, mas aqueles tempos correspondentes a épocas de grande isolamento, tornava a vida mais autentica, e eu sentia cada canto como fazendo parte do meu habitat natural, como se fizesse parte de mim e tudo aquilo me protegesse.

Eu acho que era feliz, e se há coisas que me assustam, é o risco de perder a memória.

(imagem docarmomesquita, com a devida vénia)

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

WikiRebels (documentário da televisão sueca sobre o Wikileaks)

O líder da Wikileaks violou o Pacheco Pereira (para não falar do Fernandes)

















Miguel Barceló, A solidão organizativa



Há um verso de um poeta alemão que diz:- Olha para as tuas convicções e vê: estão velhas. Os jornais que lemos também envelheceram, quando, como foi o caso, os deixamos de ler mesmo que por um breve período. 
Como estão os comentadores, os críticos, os jornalistas. Ponto de exclamação. Como envelheceram mal. Mesmo os criadores. Mexia entrevista Miguel hífen Manso e explica-nos que o hífen é um pseudónimo literário. Mexia, velho, à conversa com Miguel-Manso. Mexia, o culto tolerante, com Miguel, à entrada do estrelato para que visivelmente ainda não está preparado. Pedaços da conversa:
“Podíamos por exemplo falar da sua poesia, arriscar aproximações parciais", diz Mexia, "comohermetismo ou imagismo", diz Mexia. Manso "contrapõe", diz Mexia. ”Acho que sou um poeta pop”, diz Manso. "Porquê pop", interroga Mexia. Miguel –Manso “meio encabulado”, diz Mexia, "diz apenas", diz Manso: “Um amigo disse-me e eu gostei”. 
"E fica sorridente com a resposta", diz Mexia.
i, levezinho, tem agora à escrita Inês Serra Lopes. É impossível ler Inês Serra Lopes sem ouvir Serras Lopes. A voz de Serras Lopes gruda-se às páginas do i, e como estas são poucas , empapa o jornal e cola--se nas mãos do incauto leitor.

Ainda no Público, Pulido Valenta inquieta-se com a dificuldade que tem a direita portuguesa para se unir. VPV queria-os mais unidos, tipo União Nacional. 
São José Almeida, uma excepção no panorama jornalístico, entusiasma-se com Carlos César. Como Mexia com hífenManso. Uma pessoa tem que se entusiasmar. Já dizia o Régio que em Portalegre, aos pés da estranha casa do Largo do Cemitério, frente aos ciprestes, se humanizam as coisas brutas e se têm tais criancices que é melhor ter pudor de as contar seja a quem for.
Segundo alguns o que caracteriza a cena actual é que deixámos de ter pudor. Contamo-nos a todos e contamos tudo. Uns por profissão e com o devido lucro. Outros por terapia. Outros na vertigem do tempo.
E queremos saber tudo. Ora isso é perigoso, como se sabe desde o Fausto, desde o paraíso perdido, desde a maçã, desde o pecado original. Deus sabe tudo. O Imperador sabe tudo. O Imperador e os Assessores. As Instituições responsáveis da Democracia parlamentar, diz Pacheco Pereira. Essas sabem tudo e sabem o que nós, a turba, nós a fonte da soberania, nós as massas votantes devemos saber. E ignorar.
Pacheco diz, sem originalidade, o que os colegas têm repetido ad nausea. As revelações da Wikileaks são um perigo para a nossa Sociedade. O líder da Wikileaks é um terrível anarquista.
Pacheco escreve isto depois de uma cansativa análise que devia ter como subtítulo “A actualidade de Marx”. Pago a 10 000 palavras, Pacheco recorre à sua memória de trabalho de Comunista primitivo: Marx, Hegel e a situação das classes proletarizadas na primeira revolução industrial. É como se o ouvíssemos a chamar por Stetson. Mas o que sai do chão que Pacheco remexe é o sacrossanto respeitinho pelos “mecanismos da democracia que implicam mediação, conhecimento, saber, especialização” quer dizer censura, acesso restrito, sigilo, classificação da realidade. Por quem? Pelos eleitos? Não, pelo Pacheco, pelos sábios conselheiros secretos, pelos que a si próprios se arrogaram o direito a decidir a verdade a que temos direito.
Pacheco, Fernandes, Valente Mexia, eu estava quase morto. Mas mesmo do frio dos quartos dos lares ilegais me havia de levantar para vos dizer:

sábado, 11 de dezembro de 2010

FogeMariaFoge: Manifesto dos economistas aterrorizados

FogeMariaFoge: Manifesto dos economistas aterrorizados: "Associação Francesa de Economia Política (AEFP) Manifesto dos economistas aterrorizados Crise e Dívida na Europa:10 falsas evidências, 22 ..."

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

É UMA QUESTÃO DE BANCOS



"BCE: PORTUGAL E ESPANHA NÃO PRECISAM DE AJUDA"


Dos Espanhóis, não sei. Mas mal de muitos de nós se não fosse o BA.

Há quem ainda nada tenha percebido

por Pedro Viana


O Luís Rainha tem toda a razão:

Isto, numa suposta democracia, parece-me de todo inaceitável.

Esta é a questão principal que deve ser debatida. Os detalhes das documentos publicados pela Wikileaks são importantes, mas secundários. O essencial é que tais documentos provam, de cada vez que um é divulgado, que governos de Estados que se auto-caracterizam como Democracias, mentem a torto e a direito aos cidadãos desses Estados, realizando actos ilegais segundo as leis que dizem defender, o que efectivamente prova que a sua auto-caracterização é uma mentira. É uma mentira que os cidadãos em tais Estados possam decidir em consciência, na posse de toda a informação relevante para tomarem a sua decisão, quem os deve governar através de eleições.

Este é o facto mais importante das revelações da Wikileaks, e é o que tem posto a oligarquia destas pretensas democracias tão enraivecida, pois dele resulta a des-legitimização do Estado pseudo-democrático aos olhos da população, o que dificulta o seu controlo. Esta é a razão porque tem um interesse secundário o facto da Wikileaks ter mais dificuldade em obter informações provindas de Estados (mais) autoritários: já sabemos que "eles" são "maus", e que mentem às suas populações. E estas também o sabem. Não precisam das revelações da Wikileaks para serem forçadas a uma confrontação com a realidade dos sistemas político-sociais que as controlam.

Aproveito ainda para chamar atenção para este excelente post por Henrique Sousa no blogue "O que fica do que passa":

"A reacção dos poderosos a estas revelações é sintomática de que a democracia política e a liberdade de expressão e informação param na fronteira dos seus interesses e têm um mero valor instrumental nas democracias liberais cada vez mais corroídas por dentro pelo capitalismo desenvolvido de que seriam a forma contemporânea.(...)

De facto, a colocação no espaço público dos documentos pelo Wikileaks é um acto político de combate à hegemonia informativa do Império que procura gerir o discurso público do poder conforme os seus objectivos de dominação. Em que cidadania e sociedade civil são termos invocados pelo poder na medida em que não aborreçam os interesses instalados dos poderosos.(...)"

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

NATAL DIGITAL...


...ou o Presépio mais de dois mil anos depois.

OS EUA x JOHN LENNON

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

SOB A PROTEÇÃO DA NOITE...


Tombando suavemente sobre o povoado, a noite envolve a rua deserta em total negritude.

Por debaixo de algumas portas, escapam-se alguns raios de luz, de momento a única coisa reveladora da existência de vida no meio da escuridão. Não tarda muito para que essa luz se extinga também.

O lugar adormece finalmente.

Um ruído abafado, denuncia a presença de movimento. Uma porta mal oleada, range ao entreabrir-se, e uma figura esguia entra rapidamente.

Nas suas costas, a porta volta a fechar-se.

Por detrás de uma janela, a mulher velha que sofre de insónias, faz o sinal da cruz.

Ao longe, ouve-se o uivar do lobo.


(imagem " Principalmente Poesia)

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Ulrich, banqueiro manhoso mas com uma língua pensadora

por João Tunes

Em cavalgada suave em cima da crise e da austeridade, para já em ritmo de passeio, aproximam-se as ofensivas fundas contra os direitos sociais, nomeadamente os de âmbito laboral.

Obviamente que as empresas, as que vivem (só ou também) do mercado interno, sabem que as baixas consideráveis nos rendimentos em ordenados, reformas e subsídios, com aumento das contribuições fiscais, vão levar em linha recta à retracção aquisitiva e, portanto, a uma menor circulação de mercadorias e serviços. Logo, facturação a cair à vista. Se assim está decidido, por uma pretensa fatalidade da lógica de esbulho fiscal em tempo de crise indomável, o patronato e a burocracia eurocrata avançam com imaginação na perspectiva de formas em que as certas e seguras dificuldades para as empresas sejam “devolvidas” aos “responsáveis” pela retracção das compras (os trabalhadores-consumidores). Ou directa e descaradamente em termos de rendimentos laborais enquadráveis em estratégias à medida de retracção de custos, ou, talvez sobretudo, aproveitando a onda de fatalidade psicologicamente adquirida, tentando atingir antigos alvos na fragilização laboral dos trabalhadores. E, na regressão de direitos, o grande alvo é a liberalização dos despedimentos individuais (e de que Passos Coelho já tinha dado um cheirinho no seu projecto de revisão constitucional mal chegou ao comando do PSD). Um burocrata eurocrata veio avançar com o “conselho” da baixa no valor das indemnizações nos despedimentos. Agora, o banqueiro Fernando Ulrich colocou, preto no branco, com a pretensa coragem dos quebradores de tabus, a defesa não da baixa das indemnizações mas a atribuição do absoluto poder arbitrário do patronato para despedir quem quiser e quando quiser e sem sequer indicar as (eventuais) razões.

A fragilização laboral pretendida por Ulrich, e naturalmente que este senhor – reles senhor – é apenas o mais descarado de um vasto grupo de pressão, atingiria não só a segurança como a marca de identidade que liga o trabalhador a um posto de trabalho. Ou seja, colocaria cada um no máximo patamar da precariedade, a de trabalhar sem qualquer rede nem raízes. Qualquer trabalhador seria, assim e automaticamente, mais precário que até o contratado a prazo, pois o prazo de cada um seria o do dia (ou hora) do momento. E, claro, a menos que possuído pela coragem dos temerários, incapaz de reivindicar, sindicalizar-se, defender-se, seguindo uma pauta de comportamento laboral que não se guiaria por contrato ou códigos de conduta mas indo até à decifração muito fina e apurada dos humores dos mandantes (do chefe até ao patrão), pois a esta rede de poder, às suas deliberações mais íntimas, competia saber se cada um é uma “boa” ou “má” “companhia na companhia” (usando a terminologia do celerado Ulrich).

Dá que pensar o facto de este pico de ofensiva antilaboral seguir-se imediatamente a uma “greve geral”. O que significa que o patronato mais agressivo não se assustou. Antes, pelo contrário, soube ler as debilidades da ligação sindical aos trabalhadores e a incapacidade de se articular e integrar as formas de luta, principal demonstração e consequência daquela jornada.

(publicado também aqui)

CONFIANÇA


Esta vida composta de fatalidade
amanhece de céu cinzento.
Não se pode reverter a enfermidade
fazendo do queixume argumento,
mas despindo-me do sofrimento
e pondo de lado a mágoa,
abrirei a porta a nova morada,
ao murmúrio afável da água,
e afasto o fio da espada.
E o que de fatal se tinha por certo
dissipa-se na força da esperança
ficando cada vez mais perto
a razão para a confiança.
E mesmo que amanheça sem versos
a vida há-de brotar semente,
juntaremos os sentimentos dispersos
comungando a alegria que então se sente.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A FIGUEIRA DO VELHO VEREDAS

É conhecida a facilidade com que por vezes nos devotamos a certos ídolos, que na maioria das vezes se acaba por concluir que têm pés de barro.

Da mesma forma e com igual facilidade, consideramos quase como monstros, pessoas que mal conhecemos, mas de quem se diz “cobras e lagartos”, normalmente sem sequer sabermos porquê.

É de uma dessas pessoas que vou falar.

A história é longínqua de mais de quarenta anos, e foi-me contada por um amigo. É portanto, uma história em segunda mão, mas que vou contar como se fosse minha. Naturalmente que o nome aqui usado, é fictício.

O Veredas, era um velho barbudo, de aspecto descuidado e carapuça sempre enfiada na cabeça, e a quem nunca vira acompanhado de ninguém. Verdade se diga que ele próprio, não era fácil de ver, a não ser por quem se aproximasse do canavial que separava a sua horta, dos terrenos baldios onde a rapaziada costumava brincar. Só que essa aproximação, só por si, já era um perigo enorme, pois todos sabíamos que o Veredas era um velho mau e perigoso, capaz de fazer mal a uma criança indefesa. Não que nós alguma vez tivéssemos visto ou ouvido qualquer ameaça a quem quer que fosse, mas porque era o que todos diziam.

Perto do canavial, eram bem visíveis duas enormes figueiras, carregadas de figos maduros.

A fome era mais forte que o medo, e não havia Veredas à vista. Parecia certo que ele não estava na horta, e o canavial não era obstáculo para um rapagão de sete longos anos.

Não resisti à tentação, nem fiz muito por isso. Enquanto o diabo esfregou um olho, estava em cima da figueira que me pareceu ter os melhores figos.

Não sei quantos já comera, quando ouvi um ruído. Ao olhar para baixo, tive a clara visão do Inferno: O Veredas estava a olhar para mim. Fiquei de tal modo aterrorizado, e o meu medo devia ser tão visível que o próprio Veredas terá tido pena de mim. Olhou-me e falou sem parar:

---“ Escusas de estar a tremer que eu não te faço mal. Come à vontade e podes voltar sempre que tenhas fome. Mas quando acabares, quero as peles dos figos todas enterradas.”

O Veredas afastou-se rapidamente, e foi já a alguma distância que olhou para trás, e gritou:

---“…mas nunca tragas a cesta!!!”

O Veredas afastou-se definitivamente.

A minha pouca idade e o medo de que estava possuído, levou-me a fugir dali a sete pés, sem entender praticamente nada e sem enterrar as peles dos figos que comera.

Nunca mais esqueci o Veredas, e com o passar dos anos, fui entendendo cada uma das suas palavras, até concluir que o Veredas era um Homem bom, que por razões que só a ele respeitavam, escolhera ser solitário e afastar-se dos outros, que por maldade ou ignorância, não o respeitavam nem entendiam a sua forma de vida.